A adoção de ferramentas tecnológicas pelas cidades tornará possível monitorar o meio ambiente, as cidades e as atividades humanas, a fim de extrair métricas que definirão as ações a serem executadas.
O ano de 2021 foi um ano de grande avanço nas discussões sobre questões ambientais. Grandes representantes das nações se reuniram para debater (e chegar a um consenso) sobre as melhores decisões em prol do planeta. Um desses eventos foi o grande encontro em Glasgow, durante a COP26, onde tive a chance de ouvir inúmeras propostas que buscam reverter a ação do homem e preservar o meio ambiente. Contudo, o que ficou claro, é que não há meios de mudar o cenário atual sem o uso da ciência de dados e a sua relevante atuação em ações que visam colaborar para o enfrentamento às questões climáticas.
Um dos grandes temas e pilar de discussão foi a questão da descarbonização do transporte e como esse ponto passa a ser muito além de gestão pública, inteligente e integrada a partir do uso da ciência de dados, do que apenas infraestrutura.
Acelerar a transição para emissões líquidas zero será vital para conseguirmos manter o aumento da temperatura global perto da meta de 1,5 graus. De acordo com a ONU-Habitat, as cidades consomem 78% da energia mundial e produzem 60% das emissões de gases de efeito estufa. Mas, apesar de representarem menos de 2% da superfície terrestre, ainda é um valor considerável quando pensamos no montante. Sendo assim, a adoção de ferramentas tecnológicas pelas cidades tornará possível monitorar o meio ambiente, as cidades e as atividades humanas, a fim de extrair métricas que definirão as ações a serem executadas.
Nesse sentido, a plataforma Trancity, desenvolvida pela Scipopulis, faz diversas análises de dados relacionados ao transporte público, e foi apresentada durante o evento com este principal propósito. Dentre as análises realizadas pela ferramenta, está um modelo de Estimativa de Emissões de Poluentes do Transporte Público, que permite estimar a quantidade de poluentes gerada por cada veículo a partir de dados reais da operação. Os resultados desse modelo deixam claros os benefícios da substituição de ônibus tradicionais por modelos elétricos, à medida que essa transição é realizada pelo poder público.
Um outro exemplo de aplicação da ferramenta foi a análise feita durante a pandemia na cidade de São Paulo. Foi possível identificar com precisão a diminuição das emissões causada pela redução de frota circulante na cidade e pelo ganho de velocidade dos ônibus. A ferramenta, além de analisar os dados de operação de qualidade do serviço de transporte público, foi – e é – capaz de gerar diversas métricas em relação ao impacto ambiental do transporte público que ajudam o gestor público a identificar, por exemplo, as linhas que mais poluem na cidade ou as áreas mais afetadas pela poluição gerada pelo transporte público, permitindo ao gestor direcionar os investimentos em eletrificação nas áreas que mais sofrem com os impactos da poluição.
Além disso, conseguimos estimar a quantidade de energia necessária para operar linhas existentes com ônibus elétricos, avaliando se características da linha, como a aclividade ou o modelo de ônibus utilizado, são viáveis para operação elétrica com as tecnologias atuais. Questões simples como essa impactam consideravelmente os custos operacionais e devem ser consideradas ao se planejar a transição energética do transporte público.
Estes insights podem ser obtidos apenas com uma gestão inteligente de frotas, e apesar de discussões sobre o uso eficiente do transporte público ser um fator de atenção, pequenos detalhes precisam ser levados em conta, como por exemplo, o tempo de vida de bateria e as formas de carregá-las nos ônibus. É preciso que prolonguem o tempo de vida da bateria, evitando que se troque de forma desnecessária este componente pois é algo que pode comprometer o equilíbrio financeiro dos contratos.
Então, não basta apenas planejar a operação com ônibus elétrico. É necessário monitorar essa operação para ter certeza de que as suas variáveis não estejam mudando ao longo do tempo e impactando as projeções realizadas durante a elaboração dos contratos, pois isso levaria a um aumento de custos e comprometeria a sustentabilidade financeira do sistema.
A ferramenta, portanto, tem como um dos objetivos ajudar a fornecer os dados e os subsídios para planejar essa mudança e preparar os novos contratos de transporte que estão vencendo nas cidades e vão começar a ser renovados com o foco na eletrificação. Outro papel é monitorar a operação para garantir que as métricas e os parâmetros que foram especificados no planejamento continuem válidos.
É nesse contexto que a tecnologia atua de modo favorável. A cidade é um sistema complexo e cada mudança realizada pode ter impactos imprevisíveis em diversas outras áreas. Os gestores tendo acesso a esses dados integrados para medir o impacto de uma mudança na cidade, conseguem uma melhor tomada de decisão para a gestão pública e, sobretudo, melhoram a qualidade de vida da população, já que as iniciativas são integradas.
A descarbonização do transporte público é justamente uma dessas mudanças complexas. Se por um lado é algo que as cidades sabem que vão ter que fazer, por outro lado poucas estão agindo com metas claras e objetivas de como fazer isso. A partir de agora, acredito que essa é uma área que vai avançar bastante nas administrações municipais. Vai ficar muito mais claro para as cidades o que elas têm de fazer, como planejar ações concretas e realizá-las em um curto intervalo de tempo.
Chego à conclusão de que para reduzir os impactos ambientais do transporte e obter resultados mensuráveis, precisamos analisar os dados de forma criteriosa e transparente. Com isso é possível viabilizar as mudanças necessárias, reduzir as necessidades de investimento, e garantir os resultados que evitarão um cenário catastrófico de mudança climática. É preciso agir hoje, pensando no amanhã.