Por Roberta Cipoloni Tiso, diretora de Marketing e Sustentabilidade da green4T
Os eventos climáticos registrados no sul da Bahia ao final de 2021, no estado de Minas Gerais no início deste ano e agora, em Petrópolis, região serrana do Rio de Janeiro, confirmam as estimativas do relatório da ONU – Atlas of Mortality and Economic Losses from Weather, Climate and Water Extremes – que aponta as enchentes como a maior ocorrência (59%) dentre os desastres naturais registrados na América do Sul. Das 10 principais catástrofes verificadas na região na última década, nove foram inundações causadas por fortes chuvas.
O mesmo estudo, apresentado em setembro de 2021 pela World Meteorological Organization (WMO), das Nações Unidas, revela que desastres naturais – causados ou não pela alteração do clima – se tornaram cinco vezes mais frequentes e intensos nos últimos 50 anos.
De acordo com a pesquisa, nas últimas cinco décadas, foram mais de 11 mil desastres naturais no planeta, vitimando 2 milhões de pessoas (+90% em países em desenvolvimento) e gerando perdas econômicas da ordem de US$ 3,64 trilhões. A China (com 577 ocorrências) e os Estados Unidos (467) lideram os registros mais recentes, entre 2000 e 2019. Já a região onde mais se mais concentram estas ocorrências – sejam elas de origem climática, geológica ou hidrológica – é a Ásia-Pacífico: oito dos dez países mais afetados estão nesta localização geográfica.
Tecnologia para prevenir, remediar e recuperar
Na esteira destes eventos, surgem empresas, startups e iniciativas governamentais focadas no desenvolvimento das chamadas “disaster technologies” (D-techs): as tecnologias para prevenir desastres naturais, remediar o seu impacto e recuperar as localidades e populações afetadas.
O êxito que vem sendo obtido pelas D-techs está demonstrado no mesmo estudo do WMO de setembro passado. Nos anos 1970, cerca de 50 mil pessoas perderam a vida em razão destas ocorrências naturais. Na década passada, foram 20 mil, devido ao aprimoramento de todo um ecossistema de informações geradas multilateralmente e que colabora na qualidade e no tempo de resposta das autoridades diante de situações críticas.
Algumas destas tecnologias merecem uma observação mais atenta, como drones; mobile Vulnerability Analysis and Mapping (mVAM), tecnologia utilizada para coletar e agregar dados junto a populações em vulnerabilidade; Noble Intelligence, um algoritmo de inteligência artificial que integra imagens de satélites, dados geoespaciais e outras informações para avaliar determinadas situações em curtíssimo prazo; Sensores sísmicos de baixa frequência; Flood Forecasting, modelo de previsão de inundações a partir da combinação de AI, machine learning e satélites meteorológicos; NASA Finder: um dispositivo do tamanho de uma bagagem de mão, capaz de detectar o batimento cardíaco humano sob 6 metros de concreto sólido ou 9 metros de escombros, lama ou detritos e, Serval Project, um sistema de comunicação mobile que permite que aparelhos celulares estabeleçam contato mesmo fora da área de cobertura ou quando a rede local está inoperante, como em casos de catástrofes naturais de grande porte.
Década de oportunidades
Embora preocupante do ponto de vista ambiental, a década de 2020 também poderá ser lembrada como aquela que estimulou a criação de recursos tecnológicos e inovações capazes de colaborar no embate ante às mudanças climáticas em diferentes abordagens, bem como mitigar o impacto negativo delas na sociedade e no planeta.
Inclui-se, por exemplo, a necessidade de contar com infraestruturas de TI absolutamente seguras, confiáveis e de alto desempenho a fim de suportar essa imensa carga de dados, informações, imagens, análises das mais diversas fontes que municiarão as autoridades governamentais e agentes públicos e privados na linha de frente do enfrentamento ao aquecimento global.
Os próprios data centers precisarão contar com recursos de proteção de nível máximo ante às mesmas ameaças naturais que ajudarão a combater. Alagamentos, desmoronamentos, interrupção de fornecimento de energia, tempestades elétricas e outras situações que precisam ser evitadas pois afetam a disponibilidade do centro de dados, colocando em risco, assim, toda a cadeia de informação que ele sustenta.
A transição energética da economia e das atividades humanas também está no bojo deste grande processo de desaceleração do aquecimento do planeta. Descarbonizar o transporte público, por exemplo, não se resume apenas a substituir motores movidos a combustível fóssil por propulsores elétricos. É preciso compreender, por meio da ciência de dados, onde, como e quando realizar a mudança, a fim de não prejudicar a qualidade do serviço prestado às pessoas e garantir o cumprimento do seu objetivo prioritário: a diminuição das emissões de gases do efeito estufa nos centros urbanos.
Também será preciso o desenvolvimento de novos processos industriais, agrícolas e sistemas logística de baixo impacto ambiental. Tudo isso sem mencionar o estímulo aos novos hábitos de consumo da população mundial, com o intuito de reduzir o desperdício de recursos naturais e o volume de resíduos. Tudo isso ajudará a tornar os efeitos dos desastres naturais menos onerosos às populações dos países e ao próprio planeta.
Há, portanto, um enorme potencial para as D-techs – como fora com as fintechs e medtechs – na criação de oportunidades até 2030, sobretudo para aquelas empresas e organizações que queiram propor tecnologias efetivas para este fim: colaborar para melhorar o bem-estar das pessoas e a resiliência das cidades antes, durante e depois de eventos climáticos críticos.